James Clerk Maxwell: as leis do revolucionário e maior físico teórico da história (PARTE II)

AS EQUAÇÕES DE MAXWELL

É aqui que as coisas começam a se embelezar (até mesmo para os medrosos das fórmulas da física, que vão ser bem elucidadas aqui, prometo). Maxwell reuniu toda a história e conseguiu o que um antigo professor meu chamava de "fazer o eletromagnetismo caber no bolso".

Antes de olhar as quatro equações que fundamentam todo o eletromagnetismo, devo ressaltar logo de início: as duas primeiras equações descrevem o funcionamento "isolado" da eletricidade e do magnetismo, respectivamente; as duas últimas elaboram, finalmente, o princípio eletromagnético unificado. 

Os campos magnéticos e elétricos, e suas respectivas forças, são uma medida vetorial, ou seja, possuem direção, módulo e sentido. São dinâmicos, ou melhor, eletrodinâmicos.

Dizemos que as equações de Maxwell podem ser divididas em dois grupos: o grupo dos dois primeiros é ligado à carga (divergente); o grupo dos dois últimos são ligados à indução. Vamos a elas:





Antes que o leitor se desespere, devo falar que a dedução matemática parece absurdamente tenebrosa, mas a teoria explicada belíssima. 


1º) Lei de Gauss (eletrostática)

A primeira lei de Maxwell é formulada pelo matemático Carl Friedrich Gauss, publicada em 1867. Antes de esmiuçá-la, vamos à definição inicial do que isso significa em termos "humanos": 

É nada mais do que a exposição de como se dá a relação causal entre carga elétrica e o campo elétrico gerado. Da fórmula temos:

 ∫E.dA = Qint / ε0

Da forma integral, temos no primeiro lado da igualdade:

E = Campo elétrico
dA = A área (superfície fechada) através da qual o campo se manifesta (calculada na integral como dA, isto é, pedacinhos infinitesimais a fim de obter uma aproximação)

A explicação da utilização da integral não é tão urgente nas duas primeiras leis para o entendimento teórico das mesmas. Peço ao leitor que suspenda a consideração temporariamente em volta do símbolo integral.

Voltando à equação, o que esse  primeiro lado da igualdade nos diz é simplesmente o seguinte: "A atuação do campo elétrico sobre (a integral de) determinada área é igual à...

O outro lado da igualdade nos diz que:
Qint = quantidade interna de carga (na forma diferencial lê-se densidade da carga).
ε0 = permissividade elétrica, isto é, o ambiente sobre o qual está ocorrendo a atuação do campo.

O resumo da ópera é super simples: A ação do campo elétrico E sobre a a área A (primeiro lado da igualdade) depende da quantidade interna da carga sobre o ambiente no qual é efetiva (segundo lado da igualdade). Entende-se, por dedução, que as cargas podem ter diferentes sinais dependendo desses fatores. Veremos a seguir que o mesmo não ocorre para a lei de Gauss no magnetismo.




2º) Lei de Gauss (magnetismo)

A ideia condensada é basicamente explicar que não existe monopolos magnéticos, ou seja, se tentarmos dividir dois polos de um imã em dois, não haverá um polo sul isolado e um polo norte isolado. Será criado, ao contrário, dois novos imãs de polos sul e norte novamente. 

Maxwell, ao fazer essa comparação, nos fala que, se as cargas elétricas podem ter distintos estados e sinais dependendo de alguns fatores na lei de Gauss para a eletricidade, para a lei de Gauss no magnetismo não haverá dependência de fator algum, e o resultado será nulo, como mostrado na fórmula:

 ∫B.dA = 0

= Campo magnético
dA = A área através da qual o campo se manifesta.

A razão para que seja zero é clara, portanto: se o resultado da integral do campo magnético de um ímã for zero, significa dizer que não podemos "dividi-lo", isto é, não podemos criar um polo sul e norte separadamente.



3º) Lei de Faraday/Lenz

A lei de Faraday é o ponto inicial para entendermos a interação eletromagnética pela primeira vez.

Nessa lei, há a explicação lógica da inter-relação entre eletricidade e magnetismo. Faraday notou que, quando um campo magnético varia, é observado a produção de correntes elétricas, que são associadas, claro, a um campo elétrico.

Em suma, um campo magnético atua (variando) sobre a superfície de um objeto, gerando um campo elétrico no perímetro desse objeto. A equação fala exatamente isso. 

 ∫E.dl    =    - dφB / dt 

Analisando os dois lados da equação:

∫ E.dl     =      Campo elétrico no perímetro (fio, por exemplo)
B / dt  =      Variação do fluxo magnético

Percebe-se, logo, que com a terceira lei de Maxwell, a lei de Faraday, há duas maneiras de gerar correntes elétricas: através de cargas elétricas, ou ainda com a indução de um campo magnético.

Para variar o fluxo magnético φ do campo B com o tempo (segundo lado da equação), deve-se alterar ou a geometria da superfície ou a intensidade do campo magnético B. 

Se o leitor não sabe porque diabos citei a "geometria da superfície", é necessário entender que o lado - dφB / dt na equação, antes de chegar a essa forma, era nada mais do que ∫B.ds multiplicado por -dφ/dt.

Em outras palavras, ∫B.ds é a integral do campo magnético B sobre a superfície s. É só uma outra maneira de escrever a mesma coisa.

Com isso em mente, perceba que o dl do lado esquerdo da equação diz respeito ao perímetro, ou linha, fio, etc. Do outro lado da equação, temos "embutido" um ds, que corresponde á superfície, isto é, a sua geometria.

Para concluir esse raciocínio, note que o campo elétrico atua no perímetro, e o campo magnético atua na superfície. A influência do campo elétrico sobre uma determinada área pequena tangencial de uma superfície, isto é, uma ponta, no linguajar popular, é proporcional à variação do campo magnético nessa superfície. 

Para fechar de vez a explicação da lei, tenha em mente a força eletromotriz, a saber, a força elétrica gerada a partir de uma conversão de uma forma de energia em energia elétrica, e sua fórmula ε = Δφ / Δt.

Por definição, ∫ E.dl é igual à força eletromotriz ε. Faraday, porém, notou que ao variar o fluxo magnético numa superfície, há também uma força eletromotriz. Em outras palavras, a variação do fluxo magnético é igual à força eletromotriz induzida no contorno (perímetro).

Mais uma evidência dinâmica da correlação entre eletricidade e magnetismo explicitada.

O sinal de negativo em - dφB / dt tem uma razão: Sabendo da geração de campo magnético-elétrico como um efeito causal ciclico, esse número é negativo na lei de Faraday-Neumann justamente porque o campo magnético gerado pelo campo elétrico tende a buscar "anular", isto é, se estabilizar em relação ao primeiro campo magnético que gerou o campo elétrico.



4º) Lei de Ampére/Maxwell

Digamos que a lei de Ampére (sem a interferência de Maxwell) estava precisando de ajustes. Vamos pôr o antes e o depois da equação para vermos o que Maxwell alterou.

 ∫B.dl    =    μ0.i

Ampere dizia que uma corrente elétrica i passando por um fio μ0, por exemplo, deveria gerar um campo magnético B no perímetro dl da superfície do objeto que em volta do fio e da corrente. 

Além da corrente elétrica i, isso também dependeria da permeabilidade magnética μ0, isto é, o quanto o material é magnetizável, influenciando na intensidade do campo magnético induzido, uma vez que são diretamente proporcionais. 

Em resumo, Ampére acreditava apenas no fluxo de cargas com o tempo, ou corrente elétrica como causa de um campo magnético. Se houvesse então 10 fios com correntes elétricas i passando pela superfície, a intensidade do campo magnético sobre cada dl (partes do perímetro da superfície) seria igual 10i (10 vezes a corrente elétrica).

Maxwell, entretanto, percebeu uma assimetria na equação de Ampére. Se o campo magnético gera campo elétrico, que por sua vez cria correntes elétricas, Ampére teria "pulado" um passo, o do campo elétrico. 

 ∫B.dl    =      ∫ (μ0.J + μ0 . ε0 . dE/dt)

J  = Densidade de corrente
μ0 = Permeabilidade magnética (capacidade de magnetização)
ε0 = Permissividade elétrica (similar μ0, dessa vez para a eletricidade)


Por razões de simetria, Maxwell adiciona outro termo no lado direito da equação. Tomando como exemplo a terceira equação de Maxwell veremos a relação entre CAMPOS: de um lado da igualdade o B, e do outro lado o E. 

Ou seja, na quarta equação também deveria haver uma simetria entre B de um lado e E do outro, uma vez que são estritamente correlacionados através do novo termo à época, o eletromagnetismo. Para Maxwell, além de correntes elétricas, haveria também a possibilidade das variações dos campos elétricos, através da corrente de deslocamento criarem campos magnéticos.

Maxwell percebeu que correntes percorrendo um capacitor se acumulam nas placas e geravam um campo elétrico entre as mesmas placas. Mas havia também a existência de um campo magnético.

Através de experiências em capacitores, o físico decidiu explicar a origem de campos magnéticos como resultado da acumulação de carga pelos capacitores, e propôs da ideia de corrente de deslocamento.

Diferente das correntes tradicionais que Ampére havia proposto, essa não era formada por cargas elétricas, e percorria o vácuo do capacitor na forma de um campo elétrico que variava. A corrente de deslocamento é feita de campos elétricos, e não de carga. 

AS ONDAS ELETROMAGNÉTICAS E A UNIFICAÇÃO DE MAXWELL

A partir daí, veio o "ciclo vicioso" de geração de campo elétrico a partir de um magnético e vice-versa, resultando numa oscilação, similar à das ondas.

A terceira lei nos apresenta como gerar campo elétrico a partir da variação do campo magnético. A quarta nos mostra o caminho inverso, mas qual a grande implicação disso?

Note que se a partir da primeira lei podemos ir do campo magnético para o campo elétrico, e com a segunda lei podemos ir do campo elétrico para o magnético, temos um claro ponto de oscilação, como visto no parágrafo anterior. 

Com isso, Maxwell chega à ideia de ondas eletromagnéticas, isto é, os campos são gerados perpendicularmente um ao outro, e mais, ele descobriu que tais ondas se propagam com a mesma velocidade da luz.

Como diria o professor Jorge de Sá, foi Maxwell (e Hertz) que nos conduziu ao fato de que o eletromagnetismo mostra que a natureza nos dá um padrão de velocidade natural.

De quebra, Maxwell conseguiu envolver ainda a óptica nesse bolo de descobertas. Só o fato de Maxwell sequer citar a luz ou algum princípio da ótica convencional é o suficiente para entendermos o tamanho da unificação que o cientista escocês havia proposto. 

Maxwell conseguiu harmonizar ciências separadas como eletricidade, magnetismo e ótica num único conjunto de equações, descrevendo que as duas primeiras formariam a luz da segunda, na forma de ondas eletromagnéticas, que se propagam exatamente com a velocidade da própria luz, definida de maneira extremamente aproximada. 

A hipótese foi comprovada experimentalmente e é uma das teorias mais bem embasadas da ciências. Seu achado revolucionário solidificou bases para a física teórica das décadas subsequentes, e abasteceu a esperança dos físicos a respeito de uma "teoria de tudo", como veremos numa outra postagem.

Maxwell foi a prova viva da dependência da física teórica por parte do desenvolvimento tecnológico. Suas ideias só foram comprovadas anos depois, com Heinrich Hertz. Ele provou fenômenos relacionados à luz, tais quais a refração e a reflexão de luz







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